quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Você ainda não está lá, Bárbara

Ela não cansa de me dizer: eu ainda não estou lá.
Mas a verdade é que já não estou mais aqui.


Era segundo semestre de 2005 quando eu e minha, na época, nova namorada, descobrimos que ambas sonhavam em morar fora do país. Imediatamente começamos a falar sobre lugares em que gostaríamos de viver e coisas que nos interessavam... E, no meio de uma paixão enlouquecida pelo cinema de Wong Kar-Wai, começamos a namorar a idéia de ir para Hong Kong, estudar cinema lá, onde o diretor dá aulas.

Ficamos encantadas com a idéia de mudar totalmente de vida: estudar em um país tão diferente do nosso, com pessoas com a cabeça certamente tão diferente da nossa. Sonhamos muito, lemos muito a respeito da cidade, dos costumes, da universidade e até da vida gay e da comunidade brasileira por lá. Mas então a realidade bateu na nossa cara: não tínhamos o dinheiro pra ir, nem pra nos manter lá, muito menos pra pagar uma universidade.

Longe de nos desanimar, resolvemos ver outras possibilidades. Acho que o que faltava a nós duas era a companhia de outra pessoa que embarcasse na mesma onda. Fomos a uma feira de empregos no exterior e lá encontramos um balcão de ofertas de emprego no Canadá. Eram empregos que, na verdade, você meio que pagava pra ter... era como um intercâmbio, que você pagava pra fazer, trabalhava uns meses numa estação de esqui como garçonete ou arrumadeira, e depois voltava pra casa mais ou menos com o mesmo dinheiro que empenhou.

Certamente não era o que queríamos. E isso ficou bem óbvio para o homem que estava nos explicando o processo. Então ele disse: por que vocês não emigram para o Canadá? Há um processo legal, com o visto nas mãos vocês podem morar, trabalhar, estudar e ter praticamente os mesmo direitos de um canadense.

Saímos de lá muito espantadas com essa informação e fomos logo na internet, tentar entender o processo. Pra nós não foi muito simples, pois não tínhamos a menor idéia de como aquilo funcionava. E passamos um bom ano pesquisando, pensando sobre o assunto, conversando com outras pessoas que estavam fazendo o processo. Em maio de 2006 finalmente entramos com o nosso processo de imigrantes trabalhadoras. Na verdade ela entrou e eu fui na baila, dependente dela (o canada aceita casais do mesmo sexo).


Vancouver, onde chegaremos em breve

Foram dois anos de processo, com muita espera, angústia, papelada pra juntar, testes de inglês, testes médicos, levantamento criminal... Mas em maio de 2008, finalmente, saiu o nosso visto.

Uma coisa interessante aconteceu durante esse tempo. Quando aplicamos, dois anos antes, eu era uma produtora de tevê etc. um tanto frustrada por não ter encontrado um nicho bom de trabalho, por não ter entrado, efetivamente, no mercado, e a Mari estava começando a trabalhar como assistente de edição. Ambas ganhávamos uma miséria tão miséria que chega a ser constrangedor lembrar. Dois anos depois, quando saiu o visto, ela estava bombando na Conspiração Filmes e eu havia mudado de profissão, virado editora também, trabalhando e ganhando bem pra quem acabou de se lançar em um novo mercado. Estávamos bem felizes profissionalmente e financeiramente.

Pensamos bem, respiramos fundo e resolvemos adiar nossos planos canadenses até finalizarmos nossos trabalhos no Brasil. O adiamento, inicialmente, seria de alguns meses, depois passou para um semestre e, finalmente, pra quase um ano. E, durante todo esse tempo, trabalhamos como se não tivéssemos vida. E eu procurei fingir que o Canadá não existia. Que eu estaria para sempre no Rio.

Mas o final de 2009 se aproximava e nós corríamos o risco de perder o visto. Então, finalmente, compramos a passagem. E reservamos hotel. E demos preços às nossas coisas.

Desde então, alguma coisa aconteceu comigo.
Perdi, totalmente, o interesse pelo Rio de Janeiro. Meus passeios de bicicleta, minhas praias, botecos, escaladas... Nada mais me interessa. Mesmo trabalhar anda exaustivo. E olha que andei profundamente viciada em trabalho. Só me interesso por ir embora. Por me despedir e sair. E o resto todo ganhou um tom cinzento chato.

O calor me oprime, o sol carioca me prende dentro de casa, as pessoas na rua me transtornam e me parece difícil demais encarar o dia a dia da cidade. Estou reclusa dentro da minha expectativa. É como se eu já estivesse lá. Mas ainda sim é como se ir embora não passasse de uma fantasia que, a qualquer momento, vai se desfazer.

É estranho finalmente estar tão perto de realizar um sonho e um projeto que já tem quase quatro anos. Ou melhor, quase quatro anos de projeto conjunto com a namoradaa, porque eu, sozinha, já fantasiei tanto conhecer a vida fora daqui, mas nunca me pareceu uma possibilidade real.

Esse post não tem conclusão. Acaba, simplesmente.
A expectativa de ir e viver o que quer que haja para ser vivido está mais forte do que eu.
E o medo vem junto. Prazer, sem medo, não é tão legal, eu acho.

4 comentários:

Ana Priscila Freire disse...

os fantasmas de lá são mais geladinhos...

Aichego disse...

Gostosa!

Unknown disse...

Oi! Eu estou lendo um livro chamado "We would like to inform you that tomorrow we will be killed with our families" (sim, um título enorme, eu sei haahaha) sobre o Genocídio de Ruanda e estava procurando imagens no google e achei seu blog meio que por acaso, mas adorei!

Menina, eu entrei só pra ver uma imagem e li o blog inteiro oO hahahaha.

Parabéns pelo modo cativante de escrever e visitarei mais vezes =)

;*

Aichego disse...

Oi Larissa.
Eu li esse livro tb, depois que já tinha lido aquele outro.
Sinistro ele. depois de lê-lo vi muitos documentários no youtube sobre o assunto e fiquei com uma vontade imensa de conhecer Ruanda. Talvez ano que vem.

Sobre o meu blog: obrigada pelos elogios. Eu nunca escrevo, mas quando escrevo é sempre tão loooongooooo.

Bjocas.