quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Eu vou estar falando do Gerúndio

Outro dia Mari vira para mim, feliz da vida, e conta que o Governador de Brasília, cansado de ouvir seus secretários responderem suas perguntas no gerúndio, daquela maneira peculiar que nós vamos nos estar acostumando a ouvir, resolveu abolir o gerúndio por decreto.

A tal proibição, ou melhor, a demissão do Gerúndio (com letra maiúscula assim mesmo), gerou grande polêmica na mídia, pelo menos na mídia internética. É só colocar no Google para ver. Eis que hoje me deparo, no caderno de opinião do Globo, com uma explicação do próprio Governador para a publicação de tal decreto no Diário Oficial.

Gostei. Concordo em parte com ele. Em parte discordo.
Mas achei, de qualquer forma, que o texto era bom e merecia ser publicado aqui, neste blog de uma bicha trambiqueira.
Segue aí. Boa leitura.

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Gerundiando

Agora que a demissão do gerúndio já deu o que falar, gerou opiniões e produziu efeitos, vale uma reflexão mais consistente sobre a ineficiência do setor público no Brasil.

A Constituição de 1988 pode ser adotada como um marco. O Brasil redemocratizado, que não mais seria governado por um general de plantão, precisava de regras muito sólidas para que o poder, devolvido à vontade popular, não fosse usurpado por interesses menores e ilegítimos.

O Dasp, nessa época, já tinha modernizado o setor público e já entrava em pavoroso colapso.

O Brasil das grandes estatais, da Petrobras e quanta mais fossem necessárias para o nacionalismo estatizante em meados do século passado, tinha feito Itaipu, Tucuruí, Ponte Rio-Neterói, Belém-Brasília, aeroportos, num modelo de desenvolvimento que tinha no Estado a sua força propulsora.

Foi aí que a Constituição de 1988 pegou as leis e decretos secundários e os constitucionalizou, olhando o Brasil pelo espelho retrovisor, pelo que já tinha acontecido e não pelo que já começava a acontecer no mundo inteiro.

Olhando o passado, a Constituição de 1988 ainda achava que a economia era o Estado, e foi feita para proibir roubar. Não conseguiu essa proibição pela letra da lei, mas obteve um outro êxito: proibiu fazer. A 8.666, a lei das licitações, é filha desse êxito.

Enquanto caía o Muro de Berlim, caía o socialismo soviético, a Internet ligava as pessoas e os mercados, vieram a competitividade internacional, os fluxos de capital de investimentos e os especulativos, no Brasil tinha a reserva de mercado, tabelamento de preços, atraso e caos até a redenção do Plano Real e do nascimento de uma vigorosa economia de mercado.

E o setor público? Continua com suas regras e meios retrógrados, que acreditam que podem proibir roubar por decreto, e só conseguem proibir fazer.

Tem de tudo. Controle interno e controle externos. Exame antecipado de editais e auditorias durante e depois de suas publicações. Departamentos de fiscalização e grupos de fiscais que, contratados por concurso público, têm suas próprias regras garantidas na Carta Magda. E tome Tribunal de Contas, Ministério Público, Controladoria, Ouvidoria, licensas ambientais prévias, audiências públicas, prazos de recursos, decurso de prazo, diários oficiais, comissões de licitação, comissões de inquérito, tomadas de contas especiais, compensações ambientais, licensas de implantação, e, como isso tudo custa caro, CPMF, taxas de fiscalização, imposto sobre tudo e sobre todos – e está pronta a receita do não-roubar.

Resultado final: o roubo continua livre, mas o fazer está cada vez mais complicado.

Até porque muitos funcionários públicos honestos acabam entendendo que a forma mais simples de não ter que dar explicação é não fazer nada.

É assim que a atividade-meio ganha da atividade-fim, que a ineficiência ganha dos resultados, e que os governos são vistos cada vez mais com desesperança.

Demiti o gerúndio. Demiti o fazendo de conta. Tenho desprezo pelo Diário Oficial numa sociedade que, graças a Deus, tem imprensa livre. Por que não acabar com essa herança medieval de Diário Oficial? Mostrei sua ineficiência demitindo o inexistente, uma figura de linguagem. Por que não apareceu nenhum servidor exigindo, para a dita publicação, o seu número de matrícula?

Demiti com desprezo pelas regras retrógradas. Provei-as ineficientes diante da vontade do governante, mesmo quando ridícula.

E não é que publicaram a demissão do gerúndio?

Com saudades de Hélio Beltrão e com saudades do futuro, mãos à obra para, com ousadia e, se necessário, com irreverência, modernizar o setor público brasileiro.

José Roberto Arruda
Governador do Distrito Federal
O Globo 25OUT2007 – Opinião – Pg. 7

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Aproveitando, um bom texto que encotrei na internet sobre essa mania de gerundiar (aliás com o mesmíssimo título):


Gerundiando

Este texto foi feito especialmente para que você possa estar recortando, imprimindo e fazendo diversas cópias, para estar deixando (deixar) discretamente sobre a mesa de alguém que não consiga estar falando sem estar espalhando essa praga terrível que parece estar se disseminando na comunicação. Além disso, você pode também estar transmitindo por fax, remetendo pelo correio ou enviando pela Internet.

Não estão sabendo do que eu estou falando?

Gerúndio, eis a questão. Mas não estou me importando com isso... O mais importante é estar garantindo (garantir) que os gerundistas vão estar recebendo esta mensagem, de modo que possam estar lendo e, quem sabe, consigam até mesmo estar se dando conta da maneira como tudo o que costumam estar falando deve estar soando um verdadeiro pavor para quem precisa estar ouvindo o que for dito.

Sinta-se livre para estar difundindo tantas vezes quantas você vá estar julgando necessárias para estar atingindo o maior número de pessoas infectadas por esta epidemia de transmissão oral ou escrita. É por isso que estou postando este texto no blog. Para estar alcançando todos aqueles que estiverem blogando, navegando pela internet ou apenas surfando pela web.

Mais do que estar repreendendo ou até mesmo caçoando, o objetivo deste movimento é estar fazendo com que esteja caindo a ficha das pessoas que costumam estar falando desse jeito sem estar percebendo.

Temos que estar nos unindo para estar mostrando aos nossos interlocutores que, sim, pode estar existindo uma maneira de estar aprendendo a estar parando de estar falando desse jeito.
Até porque, caso contrário, todos nós vamos estar sendo obrigados a estar migrando para algum lugar onde não vão estar nos obrigando a estar ouvindo frases aberrantes o dia inteirinho.

Sinceramente: nossa paciência tem estado a ponto de estar estourando.

Um simples "Eu vou estar transferindo a sua ligação" que eu vá estar ouvindo, poderá chegar a estar provocando alguma reação inesperada. Eu não vou estar me responsabilizando pelos meus atos. As pessoas precisam estar entendendo a maneira como esse vício maldito conseguiu estar entrando na linguagem do dia-a-dia.

Você dispensa o verbo auxiliar e o verbo de ação no gerúndio e aplica diretamente o mesmo verbo de ação no infinitivo!

É uma construção elegante, limpa, correta, muito mais fácil e com significado claro e indubitável! Vamos despachar para bem longe do nosso belo idioma essas construções aberrantes!

A regra é clara: depois de verbo auxiliar no infinitivo NUNCA se aplica verbo de ação no gerúndio!